O vinho de Sauternes resulta de um estranho processo químico, a "podridão nobre". A casca do bago vai sendo atacada desde o fim do Verão por um fungo, a Botrytis cinema, e vai perdendo
a impermeabilização. Ao longo do Outono a água da uva evapora, e o acúcar concentra-se de uma forma anormal. O resultado é um branco doce, espesso, caríssimo.
No resto do mundo, as vindimas são feitas a um ritmo frenético, apanhando cachos tal como se encontram, atirando-os para o cesto e avançando a passo de carga pela fileira de vinhas, tentando acompanhar o andamento de dezenas de outros vindimadores, tentando terminar tudo o mais rapidamente possível. Nada disto aconteçe em Sauternes. As vindimas demoram semanas e, em anos excepcionais, estendem-se até Dezembro. Cada baga é examinada cuidadosamente antes de ser colhida: se ainda não está suficientemente "podre", o vindimador deixa-a ficar na vinha. O mesmo cacho será examinado várias vezes ao longo das semanas, e cada baga será colhida quando está pronta. Esta triagem é extremamente dolorosa. Percorre-se quilómetros em passo lento com as costas inclinadas ao frio, à chuva. Os pés enterram-se na lama, as galochas criam bolhas na pele, as mãos gelam com o orvalho. Este trabalho manual liberta a mente , o espírito repousa, a Natureza com os seus tons impressionantes, que permite a serenidade, a meditação.
Autor: Gonçalo Cadilhe
Revista Única
Expresso nº1734 de 20 Janeiro 2006
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